domingo, 15 de agosto de 2010

Opinião

Implicações do Sucesso

Por Fábio Congiu
A saga Crepúsculo chega à terceira parte com Eclipse, tosco espelho atual

Valemo-nos da retórica. Imagine a seguinte cena,
prezado leitor: de um lado, você e sua namorada; do outro, seu maior inimigo. De repente, você é surpreendido por uma atitude – sua bela garota pede ao último que a beije. Para os realistas, isso seria traição; para os conservadores, prostituição. Já para Stephenie Meyer e seu público – neorromânticos? –, isso é bonito.
Na situação dada, o que você faria?
A) Atitude extrema: iria à praça pública julgá-la, humilhá-la e, em seguida, partiria para a decapitação.
B) Atitude imbecil: imploraria o perdão da amada uma vez que ela foi apenas ousada e temperamental, não sendo digna de desconfiança e raiva.
C) Atitude folhetinesca: juraria vingança a seu rival, dedicando toda sua existência a o destruir e recuperar a adúltera.
D) Atitude desesperada: leria um bom livro de autoajuda a fim de descobrir o quanto você é maravilhoso.
E) Atitude digna: terminaria a relação ou, ao máximo, conversaria com a garota sobre o ocorrido buscando compreendê-la e tentar salvar o namoro.


O vampiro Edward (Robert Pattinson), o internacional galã sem ereção, o Justin Bieber do outro mundo, aposta na aceitação cordial do adultério. Sua atitude é tão tola, fosca, oca, quanto todo esse terceiro filme da saga Crepúsculo que, apesar de tudo, nos permite levantar algumas questões. Por que digo isso? Analisemos.


Era para o filme ser uma mistura de romance adolescente e terror. Não é. Durante a maior parte das cenas, na intenção de garantir o clima de horror, predomina uma densa trilha sonora sobre a receita sem sal; no fim das contas, o que se tem é na verdade um incômodo som de maria-mole. Todavia, se o terror não valeu, diz-se que valeu o romance. Será? Casais como Drácula e Mina (de Bram Stoker/Franz Ford Coppola), Homer e Marge Simpson (de Matt Groening) são estranhos, inovadores e interessantes a ponto de conquistar tanto público quanto crítica. Agora, Edward e Bella (Kristen Stewart) não passam de mais um casal de novela sem nenhuma novidade a oferecer ainda que se trate da relação entre um vampiro e uma mulher. Mesmo assim, os livros (e filmes adaptados) de Stephenie Meyer são fenômenos financeiros. Logo, estariam as gerações gradualmente mais tapadas? Após assistir a Eclipse, creio que sim. Pensemos mais.


Garotas(os) identificam-se com Bella, adolescente insegura, esquisita, duplamente apaixonada, adúltera e com sérios problemas nasais (uma vez que está sempre de boca aberta). Garotas(os) desejam Edward, boa pinta, gentil, educado e corno manso. Mas garotas(os) também desejam Jacob (Taylor Lautner): bad boy, sarado, aproveitador. Não há terror nem romance em Eclipse – há escapismo. Muita coisa ruim já foi feita em nossa indústria cultural, mas tudo isso faz pensar que o pior ainda está por vir.


Aqueles dotados de um mísero conhecimento dificilmente gostarão do filme. Bella é o retrato (e para os fãs, o espelho) de uma segunda chance que ninguém tem, a de trocar a vida por outra. É frágil, mesquinha, inepta, caprichosa – como o mundo girasse ao seu redor, decide pacientemente com qual amante ficará enquanto os candidatos devem aguardá-la inertes. Eclipse cuida de apresentar o ápice desse comportamento esquisitamente apreciado mundo afora. Em suma, todo o sucesso da saga possibilita algumas lições e/ou impressões: nossa incompetência para a vida nos faz ainda mais egoístas, nosso escapismo nos torna tão rasos quanto os personagens de Meyer e nossa suposta falta de possibilidades ou escolhas submerge nossa criatividade como se faz nessa literatura atual.


ESTE BLOG APOIA STEPHENIE MEYER.

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